
Por Chantal Sordi
Apesar da temporada de verão 2019 não ter trazido tantas mensagens políticas como a anterior, o impacto que o movimento #metoo causou na indústria da moda ainda reverbera nos desfiles internacionais.

Enquanto algumas marcas caminham pelo escapismo em coleções surreais, que misturam um pensamento lúdico com uma maneira completamente única de vestir, como a Gucci, outras têm abraçado o sex appeal como fio condutor, seja pelo próprio histórico da maison, ou simplesmente para fortalecer a mensagem de que as mulheres têm, sim, o direito de usar o que quiserem e mostrar o corpo como preferirem, sem que as julguem por isso.

Na Saint Laurent, por exemplo, Anthony Vaccarello não poupou esforços para criar uma imagem feminina ultrassensual e poderosa. Em seu quinto desfile à frente da maison francesa, o designer norte-americano mesclou looks de alfaiataria boyish com produções dignas de rockstars, compostas por microshorts e jaquetas sequinhas de mood western, acompanhadas de maiôs cavados, bem oitentistas.

A proposta segue uma linha de pensamento similar à de seu fundador, um dos responsáveis pela glamorização da liberdade sexual dos anos 1970, ao lado do icônico fotógrafo alemão Helmut Newton. Por trás das imagens de Saint Laurent e Newton sempre houve uma intenção de enaltecer as mulheres pela maneira sexy e sofisticada de vestir.

É possível argumentar que, ao colocar o corpo feminino em evidência, este passa a ser um objeto, mas essa nunca foi a real intenção da dupla, muito menos de designers como Tom Ford, altamente criticado pelas imagens provocativas de mulheres e homens nus que criou nos anos 1990.

Em uma entrevista recente ao “The Independent”, Ford revelou que sempre apoiou o feminismo. De acordo com o designer, a nudez feminina é extremamente poderosa, assim como as mulheres que retrata. “Minhas mulheres não estão sentadas esperando por alguém, elas estão assumindo o controle.”

Infelizmente, esse conceito de liberdade tem sido mal-interpretado ao longo da história e, muitas vezes, usado como desculpa para justificar o assédio sexual. Hoje, graças à notoriedade de movimentos feministas como o #metoo, estilistas como Vaccarello e Hedi Slimane – que, em sua estreia na Celine (agora sem o acento), também enfatizou uma imagem sexy com minicomprimentos e bastante pele à mostra – lideram um grupo de designers que utilizam o sexo e a sensualidade como elementos de poder e não de objetificação.

Junte isso a um pensamento global cada vez mais conservador e você terá outros top players do mercado entrando na briga pela liberdade feminina, como Miuccia Prada, Christopher Kane e Victoria Beckham, entre outros.

No backstage do desfile da Prada, em Milão, Miuccia revelou à imprensa que sua coleção foi baseada no medo desse cenário ultraconservador que tomou forma nos últimos anos, especialmente após a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos.
Em um clash constante de opostos, a estilista evidencia o conservadorismo por meio de looks comportados, como os conjuntos de bermuda com blusa de gola alta, ao tempo em que o confronta com decotes generosos, uma profusão de minicomprimentos e tecidos transparentes. As prints tie dye e a cartela que mixa tons pastel e néon arremataram as produções com frescor e leveza.
Em Londres, Christopher Kane trabalha o sexo de uma maneira mais subversiva e igualmente provocativa. Enquanto as peças de shape amplo, como casacos e vestidos com maxiombreiras, ganharam recortes e aberturas, as rendas e os tecidos translúcidos dividem a cena com vestidos tomara-que-caia e saias extremamente curtas.
E, para não deixar dúvidas quanto ao tema proposto, estampas com a frase “Sexual Cannibalism” foram impressas em camisetões e vestidos agigantados.

Pernas de fora também foram destaque na Celine de Slimane, que novamente impôs sua visão glam deluxe na passarela. No desfile, que contou com 96 looks, entre masculinos e femininos, a sensualidade das garotas foi exacerbada pelos vestidos de perfume oitentista, bem curtos e decotados.
Talvez as fãs da ex-diretora criativa Phoebe Philo não queiram investir nas novas peças quando chegarem às lojas, porém, uma outra turma pode se interessar e muito. Uma vez que as produções masculinas também serão vendidas ao público feminino, o estilista francês oferece um guarda-roupa genderless que está em sintonia perfeita com a geração Z que tantas marcas brigam para conquistar.
Mas, independentemente de quem irá usar ou como, o mais importante é defender esse direito e não há melhor lugar do que a indústria da moda para isso.
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